sexta-feira, março 25, 2016

O MUNDO AGRILHOADO, MORRENDO EM FÚRIA


Não me lembro de ter assimilado uma ideia nobre, concertada, harmoniosa da multidão a que chamamos Humanidade, nunca a paz e a harmonia de que falam os artistas, os poetas, os ditadores da Antiguidade e da contemporaneidade. Havia sempre problemas à minha volta: anos difíceis da vida dos meus pais, gente a prender centenas de operários da indústria transformadora da cortiça, pessoas isoladas no campo, trabalhando de sol a sol, muitas vezes roubadas por ladrões ou simplesmente assassinadas por resistirem timidamente. Em Portugal vivia-se sob a tutela de Salazar, ditador guardado em São Bento, incapaz de pensar o futuro apesar do império feito de colónias mal tratadas, para onde ninguém imigrava a sério, como fizeram nos anos 60, portugueses deslumbrados com a aventura da casa, do dinheiro, de trabalhar para os senhores da Europa e do mundo, já esquecidos que haviam sabido atravessar os mares (quando era natural fazer isso e descobrir terras), quase no patamar da verdadeira grandeza, aquela que permite viver bem e partilhar razoavelmente as coisas. Nada disso, pequenos em quase tudo na sua terra inicial, os portugueses desataram a fugir em todas as direcções, para o mundo em volta, trabalhando como escravos ou chegando a patrões. Hoje são os licenciados que partem, depois de estudos arrancados a custo de escudos e pobres bolsas e remedeio: já acabara o Império mas subsistia a memória da história dessa gente afinal trabalhadora, que enchia bolsas de imigrantes de um lado ao outro do mundo, mesmo em plena época de novas guerras no Afeganistão, no Iraque, no Paquistão, na Argélia, no Irão, entre Islamitas, Muçulmanos, Iraquianos, Talibãs, Xiitas ou Sunitas, crentes de Alá e inimigos dos Cristãos, os das Cruzadas, senhores, durante séculos, de grandes áreas do mundo, partes do planeta com a Índia, norte, centro e sul de África, américas latinizadas, para não falar do Brasil explicado pelos portugueses e dos Estados Unidos da América, Estados e Estados a Norte, mistura de raças e interesses acerca de um tal El Dorado, submissão dos Índios.
De tudo isto, após séculos de Igreja católica apostólica romana, desaparecidas as não muito remotas civilizações da Grécia do Egipto, da Índia ou da China, desaparecidas como os Incas que falavam com o céu ou simplesmente transformadas pelo engenho tecnológico e demoníaco da genérica civilização ocidental, aquela que (mesmo em grande avanço) se envolveu com a Alemanha em duas guerras mundiais, sob o horror nazi e os campos de concentração e o holocausto, judeus presos e mortos ao que parece porque podiam competir com a «raça ariana», mito daquele cabo de guerra, Hitler, que teve de apagar corpo e alma com uma cápsula de cianeto.
Passaram várias décadas de aparente paz e desenvolvimento, a Alemanha e os tecnocratas da austeridade passaram a apertar uma já agrilhoada União Europeia. Por aqui todos tinham ajudado a criar um Estado mítico, Israel, senhor de si e dos outros, ensinando o mundo que, a partir de agora, com gente como o Daesh e os atentados de homens-bomba, uma academia do horror que nos obrigará a aprender a "viver com medo2. Diz ajuizadamente Clara Ferreira Alves na sua crónica de hoje: «Nos campos de refugiados, na degradação e na humilhação, novos radicalismos se formarão com outros nomes. A integração desta população de apátridas que só tem o Islão como pertença impossível.»



Temos aqui, de facto, um problema radical. Terrorismo Islâmico, que não brotou de nenhuma doença divina, começo nma rede de roubos, emboscadas, mistificações. Allah desceu furiosamente à Terra com a maior vontade de aplicar regras brutais, irracionais, aos homens que o amassem e que matassem em nome Dele, acedendo a um céu Total, com ofertas femininas virginais, símbolo aberto do que a mente obscura deles tornara, na terra, vítimas assimétricas das burcas, dos xailes, dos escondimentos, e de penas por pecados fundamentais. Sujeitas, em grandes áreas, ao corte do clitóris, podem vir a ser punidas, por adultério, com a morte à pedrada, na Praça Pública. Os guerreiros Jihadistas tratam os vencidos com a degolação, numa ritualidade difícil de encontrar nas épocas mais remotas. E o ESTADO Judaico ISRAEL, encravado numa zona que a Inglaterra e a França escolheram, imposta aos  palestiniamos, sabe esperar por tudo isto com as suas próprias guerras e o seu medo. Rompe compromissos, implanta Gaza, constrói muros, declara que nunca consentirá na instauração de um próximo Estado Palestiniano, embora esta gente seja dali e tenha o direito a trabalhar e a morrer ali, entre pedras, poeira e plantas secas.
A Turquia, candidata à Europa mas ainda não julgada apropriada pelos altíssimos deificados tecnocratas dos gabinetes neo-europeus, é contudo um país tampão (no caso dos refugiados vindos da Síria e outras terras lavradas a sangue). E então, a austera e mitigante Europa, sem pudor, cortejou a Turquia, pela sua especial posição geográfica para se encarregar de travar mais vagas de emigrição, deportando os despojados de injustificada ânsia. A Turquia aceitou receber para tais ensaios de novos holocaustos, empresa sórdida, a quantia de três mil milhões de euros, cuja vida e fortunas ninguém sabe onde irá parar.
Diz Clara Ferreira Alves. «Entretanto, a Grécia e a Itália sucumbem ao peso que a Europa atiçou ou malbaratou, as do Afeganistão e Iraque, da Líbia e Síria.» Obama, apesar da sua entrevista à revista ATLANTIC, lamentando o comportamento dos parceiros Cameron e Sarkozy, foi liminarmente ludibriado. E a Nato? E a ONU? Aqui, Clara escreve sumariamente: «O que é, hoje, o Oriente?» (...) «A que Médio Oriente do século XX ainda se dá existência? Esse Médio Oriente terminou ou foi terminado. Israel não é Israel. É hoje um Estado acossado e dominado politicamente por conservadores e zelotas, com um primeiro ministro que tem a certeza de que a Palestina nunca existirá.»
O Daesh talvez seja invencível. Vamos esperar, no medo, que a sua própria o eliminará. Haverá então outros refugiados, gente degradada, a humilhação formará novos imigrados e os Messias voltarão para mistificar o futuro e um deus novo, todo poderoso.
Rocha de Sousa

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