segunda-feira, julho 23, 2012

UMA NOVA PARTÍCULA, TALVEZ O BOSÃO DE HIGGS

gráfico da colisão de partículas

Julga-se que o maior acelerador de partículas descobriu o «Bosão de Higgs». A colisão reveladora de uma partícula calculada teoricamente por Peter Higgs, há cerca de 50 anos, é um facto científico da maior importância. A partícula que colidiu com outras de natureza semelhante, sub-atómicas, tem as características da que pré-anunciou Higgs: sendo invisível, o seu embate noutros componentes que rodeiam o átomo aumenta a massa deles — e é a este princípio que os cientistas se agarram como explicação da origem do universo. Ninguém pode garantir que o universo terá tido essa origem, mas em termos da lógica da ciência e das sucessivas colisões em sucessivos aumentos de massa, agregação e expansão, tudo durante milhões e milhões de anos, algo parece fazer sentido. Mas, pelo meio, ficam descobertas e perguntas sem resposta, quer sobre as galáxias, a sua forma e dinâmica, os buracos negros, a matéria negra e a interacção das forças gravitacionais responsáveis por manter a coesão da massa e tudo o que se conjuga dentro e entre os espaços galácticos, as velocidades alcançadas, a vida e a morte de biliões de matérias configurantes no simples colapso incalculável de uma estrela, que pode desaparecer ou tornar-se mil vezes maiores.
Em cima, vemos parte do grande acelerador de partículas, o CERN, onde já se trabalha e se analisa o tipo de colisões acontecidas num percurso circular de 28 quilómetros, no sub-solo. Milhões e milhões de colisões de protões lançados a velocidades extremas, foram analisados desde 2010, tendo sido possível, agora, detectar a nova partícula (simbólica e popularmente chamada «partícula de Deus»). Rolf Heuer, director geral do CERN, respondeu a diversas perguntas numa conferência de imprensa e referiu-se à «pegada da partícula» como podendo ser um bosão de Higgs, o que não limita o resultado, pois tudo parece indicar que não há apenas um bosão, o de Higgs, mas muitos derivados dos mesmos cálculos. Há outros cenários (mais interessantes) que também preveêm bosões de Higgs. O Modelo Padrão pode completar-se em torno de outros dados. Perante o desconhecimento do que seja a matéria negra, o cientista aponta para uma hipótese de aquela não ser a partícula calculada por Higgs e «isso poderia vir a funcionar como um portal», dando acesso a novos territórios do conhecimento.
Muito ainda há que fazer para que este ramo do conhecimento descubra algum sentido no universo, as suas conexões, a sua finitude que parece em lançamento alucinatório para a infinitude, tão absurda como nós pensarmos isto e a nossa consciência, cheia de certezas e perguntas, se poder apagar, transformando-se em nada, com a morte do homem.

sexta-feira, julho 20, 2012

JOSÉ HERMANO SARAIVA MORREU HOJE, 92 ANOS

José Hermano Saraiva

Nesta atitude, durante muitos anos, José Hermano Saraiva, historiador, contava (e cantava) episódios da História de Portugal, enveredando depois pelo estudo das regiões, municípios, regimes patrimoniais e cidades de valor de fundo. Fazia-o na televisão, tendo nos seus melhores momentos, sabido coloquiar muito bem com o espectador, levando-o a ver o que ele via, mantendo em off a voz de continuidade. A realização desse programa criou metodologias expeditas e de bom entrosamento para tornar apreciável e compreensível o que o contador das coisas, pessoas e histórias contava. O professor Saraiva deixa assim, para além da sua bibliografia, actividade política e cultural, um património de grande valor científico, assumido em palavras e imagens numa decorrência por vezes poética, outras vezes técnica e enquadrada no espaço português de todos os tempos.

terça-feira, julho 17, 2012

BABILANDO NA ASSEMBLEIA DO EIXO DO MAL

o eixo do mal
 



O mundo parece desfazer-se sob o véu de lixos que a sacrossanta globalização espalha sobre os povos emergentes (entre os muitos indigentes), e estes senhores do painel acima assinam um programa televisivo (O Eixo do Mal) onde operam as mais raras diatribes contra os pequenos males deste pequeno país cheio de gente ensandecida, acocorada junto do litoral, sobretudo nas grandes cidades. Por sua vez, estes senhores aceitam sentar-se num cenário de ficção científica pimba -- futurista e tudo. Pela colaboração dos participantes, o espectador é levado a suspeitar que cada qual fala por si e para si. E espera também que um fale depois do outro, em nome da boa comunicação e do bem pensar que tanto exigem dos políticos e respectivos aprendizes. Reitero o respeito que todos me merecem, meu apreço particular por Clara Ferreira Alves, sentada ao centro, como Cristo na última ceia, e tiro o chapéu ao canal televisivo que aposta neste género de algazarra de humor azedo, por vezes cínico, por vezes meramente risível -- Sócrates é convocado muitas vezes porque desbaratou as nossas confusas riquezas, às vezes lá vem a sua licenciatura de papel e agora incha o escândalo do ministro Relvas (que terá comido relva num jardim privado e logo saiu de lá licenciado, currículo irrelevante e mais quatro cadeiras que não frequentou, caricaturas reais da pequena vida nacional). Mas um programa semanal, enfatizado, merece tão pouco génio? Depois desse supremo ministro vem o pobre ministro Álvaro, arvorado em incompetente da economia, e, sempre que dá jeito e é possível, a estranha retórica do super ministro Gaspar, fala lenta e martelada que os protagonistas do mal não percebem mas vem a propósito da anedota. «Devagar, devagar, um dia ele deixa de falar». O primeiro ministro, Jesus dos Passos, dito Coelho, um homem que emagrece com o fardo da Troika e é teimoso em nome do milagre futuro. É um crente e por vezes fala tão junto do chão que ninguém sabe donde vem a esperança. E Babel é excitada, as escrituras passam a falas tonitroantes, Portas ausente, os erros de todas as explicações, Crato sem saber como justificar Educação e massificação, anos e anos de austeridade vandalizante e a Economia desidratada e anémica. É quase tudo mau, em Portugal, na Europa, e a prova chamejante são estes tribunos de aviário que cacarejam todos ao mesmo tempo a partir de uma qualquer fala isolada do início.
Mas como? Será  que não sabem nada de televisão ou, performativos, insistem em ouvir-se, sobrepondo-se, cortando a palavra a este e àquele, metendo buchas, Passos espalmado, Relvas outra vez, antecedentes e sombrias relações, tudo bombeado para a "caricatura gaguejada". E, contudo, a estes senhores foi-lhes dado, de bandeja, um espaço de intervenção excepcional, espaço que eles tratam mal em nome do mal, jamais em torno do eixo. Este meu estado de indignação, como se diz agora, não se refere só ao conteúdo das intervenções, sobremaneira erráticas, mas a elas mesmas, à forma e ao grito, uma balbúrdia de fazer inveja ao agora mais institucional Pacheco Pereira. E, depois, é o desperdício, senhores, é a falta de respeito para com as pessoas apetrechadas a tratar aqueles temas, a ouvir e a compreender. Ali sucumbe a democracia, aflora a lei do mais forte. Até o mal rebenta irredutivelmente com o eixo.

quarta-feira, julho 11, 2012

A MEGALOMANIA PORTUGUESA EM VERSALHES

Joana, feliz e poderosa, a saborear a derrota deste luxo
perante a sua obra de escala industrial, portuguesa e internacional

Tenho um certo receio de ser mal entendido ao escrever estas frases de mil sentidos, entre o luxo e o provincianismo atirado, à americana, além fronteiras, em Versalhes e sem risco de qualquer decapitação. Mesmo assim, devagarzinho, escrevo sobre a grande aventura de Joana Vasconcelos espantando assim os novos burgueses e virtualizando, na França dos nossos imigrantes, os tontos luxos daquele palácio totalizante, resto patrimonial do tempo em que as monarquias podiam romper eternamente o déficit. Com panelas, plásticos e tontura na escala, esta jovem artista portuguesa e cidadã do mundo, goza a rotunda alegria do seu triunfo. Os sapatos feitos com panelas apontam a América e uma actriz famosa. E eu acho que, além de mais tampões a fingir cristal, a Joana deveria fazer uma hambúrguer (McDonald's) que enchesse a Praça da Concórdia ou flutuasse no Sena. Não era preciso trazer essa obra para Portugal. Talvez fosse de grande oportunidade fazê-la pousar em Bruxelas com uma carta endereçada aos pobres europeus e uma ginja gigante dirigida à senhora Merkel. A liberdade de expressão, que respeito muito e por isso escrevo, assim, num espaço onde sou (por agora) bem livre, deve ainda ser suficiente para tais devaneios, embora aquele "incidente dos tampões" teria tido muito mais repercussão se Joana recusasse expor as outras peças sem essa emblemática criação, indiciando tanta coisa. Mas, recusas dessas custam caro (e não só em dinheiro): Sartre bem o disse, vertical e zarolho, ao recusar o Prémio Nobel da Literatura.
No domínio das artes a nossa Joana deveria, depois de França, começar a inventar um arranha-céus com a forma de uma das torres que Bin Laden deitou abaixo. Pode ser feito em esferovite, com a "prata da casa", e decorado em relevo e cor num estilo bordalesco, cheio de Zés Povinhos. Outra ideia boa é construir em poliéster um imenso porco, oferta dos países do sul da Europa aos balofos do norte dela. É que aquela piscinazinha de plástico, que nunca mais sai donde não devia estar, um Portugal oco e com torneiras, é mesmo muito pobrezinha e compreende-se que não esteja, com água e espuma, nos jardins geométricos de Versalhes.
A propósito dos sucessos lentos a pulso, de antigamente, Valter Hugo Mãe escreve hoje um curioso artigo no JL. E é daí que vem a fotografia publicada aqui. Não tenho espaço nem paciência para montar e desmontar as mensagens duras ou subliminares de tal peça. Mas destacarei o destaque: «Em Versalhes, diante da portugalidade digna da Joana Vasconcelos, eu era uma testemunha de uma certa emigração que se orgulha hoje de ter uma história honesta».
Aqui está, em suma, uma daquelas grandes frases, sem tampax nem Amálias de plástico. Claro que ninguém põe em causa a liberdade das artes. O mal que elas fazem é que pode ser estudado nas Universidades.